Capítulo 47 - Parte 1.

Tanara's POV: 

 - A conversa é longa, acho melhor sentar, Tanara. - Livia aconselhou, fazendo o mesmo. Sentei, juntamente de minha avó. Ok, agora podem acabar com o mistério? 

 - Pode falar, Livia. Estou curiosa! - sorri, sem graça. Ela e Fátima se entreolharam receosas e seguidamente me encararam. O que estava acontecendo? 

 - Eu não sei como começar. - nervosa, lançou um olhar perdido para minha avó. 

 - Olha... - tentei me pronunciar, sorrindo sem graça e totalmente desentendida. Todo aquele seu nervosismo não dava nenhuma pista do assunto. Aliás, só destruía as minhas quase inexistentes suposições. 

 - Tatá, Livia conheceu seu pai. É por causa dele que ela está aqui. - Fátima foi mais rápida. Ajudou Livia abrindo uma brecha ótima. Melhora? Pra mim, não. O que diabos meu pai, falecido, tem a ver com essa mulher? Por que ela veio me procurar? O que ela queria? Entre todos esses pensamentos, minha expressão facial continuava a mesma. Eu encarava-as como antes. 

 - Obrigada, Dona Fátima. Bom, Tanara, é exatamente isso. É por causa do seu pai.

 - Meu pai morreu. - respondi, sem ter a intenção de ser grossa. Era somente a verdade. 

 - Sim, sim, ele faleceu. Justamente por causa dessa perda, eu estou aqui. Seu pai e eu éramos bons amigos. Aliás, ele era muitíssimo amigo do meu marido também. 

 - Eu realmente não entendo o que você quer, Livia. Se você era tão amiga dele, deve saber que ele nunca se importou comigo. 

 - Entendo totalmente seu desentendimento. É super natural. Sinto muito por ele não ter tido papel de pai com você. Ele nos contou recentemente, não sabíamos que ele tinha outra filha. 

 - Outra? Então, eu tenho irmãos? - indaguei.

 - Sim. - sorriu. - Quer dizer, só um. João Guilherme. Tem 14 anos, parece muito com você.

 - Esse ele não abandonou? - eu sei que havia perdoado, mas essa mulher, com poucas palavras, trouxe tudo à tona. Sensibilizou todo o sentimento que eu estava trabalhando dentro de mim. Ainda restava mágoa, era inevitável. 

 - Tatá. - minha avó me repreendeu. 

 - O rancor dela é totalmente aceitável, Dona Fátima. Não, Tanara. Esse ele não abandonou. É por ele, pelo seu irmão, que eu estou aqui. Seu pai estava doente e só no final da doença, resolveu nos contar sobre você. Pareceu muito arrependido. 

 - Se arrependeu e nunca buscou sobre mim? Eu tenho 23 anos, Livia. Ele teve todos esses anos para correr atrás do prejuízo e nunca nem tentou. 

 - Ele deveria ter os motivos dele, menina. Com a gente não entrou em detalhes! Falou que teve uma filha com o primeiro amor, sua mãe. Não deu certo a relação e por fraqueza, acabou se afastando de você. Nunca teve coragem de procurá-la. Se acomodou pelo o medo, medo de ser rejeitado, julgado...

 - Contra fatos não há argumentos. Nada justifica, Livia. 

 - Você sente revolta, é compreensível.

 - Não. Eu já senti. - respirei fundo. - Depois que eu fiquei sabendo que ele veio a falecer, percebi que não valia a pena. Ele errou. Ele era humano. Deve ter pago! Todos nós falhamos. E por mais que o erro dele tenha sido gravíssimo, não temos o direito de julgar. Principalmente agora que ele não está mais entre nós. 

 - Você me surpreendeu, Tanara. Esperava ser recebida com pedras, não é fácil lidar com a falta de um pai. 

 - Minha neta é especial, Livia. Ele perdeu uma filha maravilhosa. - vovó sorriu pra mim e eu devolvi o gesto. 

 - Eu percebo. - Livia sorriu de lado, nervosa e tímida. - Depois da sua mãe, seu pai casou de novo, com a mãe de João Guilherme. Um menino tão especial quanto você. Mas, infelizmente, a mãe dele faleceu jovem e ele foi criado apenas pelo o pai. 

 - E agora? Ele vai ficar com quem? - eu realmente não sei o porquê de ter perguntado aquilo. 

 - Eu e meu marido somos padrinhos dele, Tanara. Depois da morte da segunda esposa, seu pai tentou outro relacionamento e estava com ela até os dias atuais. Não sei como era a relação do Conrado com a família enquanto estava com a sua mãe...

 - Era distante. Ele falava de vez em quando com a mãe, com os irmãos... Sua avó paterna, minha filha, só te viu uma vez, quando você era uma bebê. 

 - Imaginava! João Guilherme nunca conheceu um tio, uma tia... Era somente ele e o pai. 

 - Mas, e a família da mãe dele? Ela morreu e eles ajudaram a cuidar do menino, hum? - questionei, esperando um "sim" como resposta. Era o óbvio. 

 - Não. Seu irmão também não teve essa sorte!

 - Como não? 

 - A mãe perdeu os pais adolescente, como ele. Foi criada por uma tia. Mudou de cidade para ser independente e conheceu seu pai. Se distanciou. João Guilherme só conheceu os tios-avós quando era garotinho. Algo rápido. Fingiram interesse e não se afeiçoaram. Depois do encontro, sequer tentaram uma aproximação.

 - Nossa! Tadinho... - me comovi. 

 - Ele está sofrendo muito com a falta do pai. 

 - Eu imagino.

 - Só tinha a ele e a nós. 

 - Então, ele ficará com vocês? Ou com a madrasta?

 - A madrasta não se dava bem com ele. Ele está morando conosco. 

 - Ah, bom. - respiro aliviado. 

 - Mas, não temos direitos. Não podemos ficar com a guarda! Por isso eu vim aqui, Tanara. Seu pai me pediu que se caso ele viesse à óbito, ele gostaria que nós te procurássemos para garantir o perdão dele. Não levamos a sério, tínhamos esperança que ele vencesse a doença... 

 - Eu já perdoei. 

 - Não. A forma que ele queria esse perdão era... você cuidando do João Guilherme. - meus olhos arregalaram e ela pareceu engolir seco. Comecei a rir, nervosa, sem ter palavras. Aquilo era piada? Livia olhou preocupada para Fátima e eu resolvi arriscar uma frase:

 - Isso é brincadeira? - perfeita frase, Tanara. Parabéns! 

 - Isso é muito sério. - a voz de Livia ecoou baixo pela sala. - Você é a irmã legítima! Única que, com a morte do pai, a guarda passaria de imediato, automaticamente. É registrada, seria simples. Eu e meu marido somos loucos por ele e estamos com o coração partido. Infelizmente somos apenas padrinhos! A lei não nos permite a tutela. 

 - Livia, até minutos atrás eu não sabia da existência desse menino e de repente eu tenho que criá-lo? Como um filho? Vovó, a senhora sabia disso? - perguntei, incrédula.

 - Eu falei que o assunto era sério, não podia ser tratado pelo o telefone. - única coisa que minha avó ousou a dizer.

 - Olha, Tanara, talvez você não saiba e eu vou te informar sobre a lei. A regra geral é que depois da morte dos pais o filho fique com os avós. A ordem é: avós, irmãos maiores e depois, tios. 

 - A viúva tem direitos!

 - Eles não se dão bem. Além do mais, Conrado não era casado legalmente, só moravam juntos. Ela é uma interesseira, depois que ele morreu, não deu nem os pêsames pro garoto. 

 - Eu sinto muito, mas...

 - Você é casada. Mesmo tão nova, é casada. Sua avó me contou. Tem sua faculdade concluída, tem o seu emprego, é independente... Meu Deus, você é casada com um cantor! Olha a vida que você poderia proporcionar pro seu irmão. Tem a sua família, tem o seu marido, tem o seu próprio dinheiro... 

 - Justamente, Livia. Eu sou casada! Vovó te contou, mas, ninguém sabe. Meu marido não contou pra fãs e nem pra mídia. Eu quero construir uma vida ao lado dele, vai fazer um mês que casamos e... Isso é loucura! Eu só tenho 23 anos, esse menino viraria minha vida de cabeça pra baixo, entende? Luan já tem uma filha, eu desejo ter meus próprios filhos...

 - Ele não seria seu filho, até porque isso é impossível. 

 - Mas você está querendo que eu o crie como um.

 - Olha, me perdoe ter vindo incomodar! Realmente o que eu fiz, falei, foi um absurdo. Não tem lógica! Eu só queria que você pensasse nele. Sei que não sabiam da existência do outro, mas ele não tem culpa dos erros do Conrado. Você não conviveu com seu pai mas teve tudo. Mãe, tios, avós. Uma família que te criou muito bem! Pelo o que Dona Fátima contou, teve sorte até com namorados. Seu marido, o Luan Santana, é louco por você. Enquanto isso, João Guilherme só tinha eu, meu marido e o pai. Vocês são os únicos filhos do Conrado, legítimos... Pensei que se interessaria em ficar responsável pelo seu irmão. Eu não vim aqui à toa, tentar sua compaixão pelo o menino. Em testamento, seu pai te nomeou como tutora. Deixou uma herança pros dois, com a esperança de que você o perdoasse, aceitasse tomar conta do João Guilherme e usasse para cuidar dele. Mas, como você não quer... - encarei o chão, mexendo as mãos. - Eu e meu marido vamos abrir um processo para invalidar o documento. Com fé, conseguiremos ficar com o nosso afilhado. Obrigada pela atenção, Dona Fátima! Você foi uma querida. Obrigada você também, Tanara. Eu entendo completamente sua rejeição. Espero que você seja muito feliz na sua vida de casada. Até qualquer dia! - despediu-se. Não consegui encara-lá e muito menos me expressar.